Quem paga as dívidas da pessoa que falece?

Estamos neste planeta de passagem e a morte não manda recado, por isso é importante saber quem paga as dívidas da pessoa que falece, pois essas obrigações que ela assumiu em vida não morrem com ela. Muitas vezes, os herdeiros consideram a herança que vão receber (há patrimônio envolvido), mas talvez não saibam que compromissos contratados pelo falecido devem ser quitados pelo espólio, que é a somatória, o conjunto do que ele deixou como patrimônio.

É duro ter de pensar nisso em meio ao sofrimento e ao luto, mas há exigências burocráticas após o óbito que precisam ser cumpridas e com prazo estabelecido por lei para ser iniciado. Despesas com o funeral, abertura de inventário, processo de partilha de bens e levantamento de dívidas existentes não esperam a recuperação emocional da família ou dos responsáveis pelo falecido para serem encaminhados.

De quem é a responsabilidade pelas contas não pagas em vida

A responsabilidade continua sendo de quem morre. Do total do que for deixado pela pessoa, o patrimônio, como bens e direitos (como imóvel, veículo, joias, dinheiro, investimentos, obras de arte, valores a receber etc.) serão abatidas as dívidas que ela contratou. Só depois disso o que sobrar (se sobrar) será entregue ao herdeiro, se houver só um, ou dividido entre os herdeiros, se houver mais pessoas na linha de sucessão. Por exemplo, se o patrimônio deixado for de R$ 150.000 e as dívidas forem de R$ 100.000, apenas R$ 50.000 irão para os herdeiros.

Se por acaso o total for suficiente apenas para quitar as dívidas, ficando no zero a zero, não haverá o que dividir entre quem ficar vivo. Por exemplo, R$ 150.000 de patrimônio e R$ 150.000 de dívidas.

Mas e se a pessoa for endividada ou inadimplente e não deixar patrimônio algum? O que vai acontecer com suas dívidas? Infelizmente, o credor terá de arcar com o prejuízo, pois nenhum herdeiro tem obrigação de pagar pelas dívidas de quem falece. E isso independe de haver cláusula contratual assinada por ele afirmando o contrário. Por isso, é muito importante contar com o acompanhamento de um advogado que tenha experiência para prestar assistência nesse processo após a morte.

Saldos remanescentes de empréstimo consignado e de financiamento de imóvel podem ser quitados sem prejuízo ao espólio se na contratação do crédito estiver incluído um seguro para cobrir a dívida em caso de morte ou invalidez do devedor. Ler o contrato e entender direitinho as cláusulas que envolvem essa questão do seguro, bem como determinar o(s) beneficiário(s) no caso de imóvel (para quem vai ficar aquele bem) são muito importantes, pois podem evitar dor de cabeça posteriormente.

A que mais os herdeiros têm direito?

Se a pessoa ainda estava ativa no mercado de trabalho até seu falecimento e tiver benefícios trabalhistas para receber, como saldo de dias trabalhados, férias, 13º salário, bônus, comissão e horas extras, eles devem ser solicitados diretamente à empresa ou por meio judicial. Saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) também pode ser sacado. Lembrando que para tudo isso é preciso seguir procedimentos determinados por lei e/ou pelas instituições envolvidas.

O que aconteceu em minha família

Geralmente, só pensamos na morte no momento que ela acontece, mas no planejamento financeiro bem estabelecido até essa questão é abordada, já que ela é a única certeza que temos a partir do momento em que nascemos. Por isso, não tenha medo ou vergonha de conversar sobre isso com sua família.

Vou contar o que aconteceu comigo. Meu pais não acumularam patrimônio expressivo e, ao longo da vida, o único bem que adquiriram foi uma casa que ajudei a reformar e a melhorar depois que comecei a trabalhar. Em 2010, fui visitá-los, pois há muitos anos já morava longe deles, e ao vê-los mais idosos, sem reserva financeira alguma, chamei minha única irmã para conversar sobre o momento em que eles partissem – inventário, cartório, advogado, despesas. Falei que o melhor que poderia acontecer era eles se anteciparem fazendo uma doação em vida com usufruto, ou seja, o direito de continuar naquele imóvel até o momento da partida final. Assim, não teria o processo de, morrendo minha mãe ou meu pai, ter de fazer inventário e passar aquele bem para o cônjuge que ficasse vivo e para minha irmã e para mim. Depois, quando o outro partisse, fazer tudo de novo. Se eles fizessem a doação em vida, algumas etapas seriam eliminadas, despesas desnecessárias seriam evitadas e eles continuariam “donos” daquele imóvel sem nenhum problema.

Certamente, foi um pouco desagradável no início dizer a eles que precisávamos falar sobre essa questão, mas que conversar antes poderia ajudar todo mundo, independentemente de quem falecesse primeiro. Fui falando calmamente e até pontuei que minha irmã e eu poderíamos morrer antes deles, mas que naquele momento eu iria considerar o ritmo natural da vida. Eles fizeram algumas perguntas, foram compreendendo e concordaram. Aproveitei para comunicar que eu iria abrir mão da minha parte em prol da minha irmã e que, fazendo dessa forma, o processo pós-morte seria bem menos burocrático para todo mundo. E assim fizemos. Claro que teve despesas também, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) – veja o que é aqui -, mas nada comparável com o que seria sem essa antecipação. Outro ponto quando olhamos para o ITCMD é que hoje sua alíquota é muito baixa em todo o Brasil, mas vira e mexe há alguém do governo falando que ela deveria ser mais alta – e isso pode acontecer futuramente.

Enfim, cuidar do dinheiro não se resume apenas ao tempo em que estamos vivenciando, com saúde e vitalidade, a experiência extraordinária que é estar neste planeta. E como a morte é inevitável, melhor olhar para ela com mais naturalidade e evitar deixar problemas para quem terá de cuidar de toda a parte burocrática depois.

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Escrito por Amandina Morbeck | Foto: Brett Sayles/Pexels

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